sexta-feira, 17 de julho de 2020

42ª Parashá - Matot - מַּטּוֹת

Tribos
Parashá: Números, 30:2-32:42
Haftaráh: Jeremias, 1:1-2:3
Resumo da Parashá
"Tribos" é o titulo que por consenso atribui-se a esta parashá, palavra que se sobressai no primeiro paragrafo do texto hebraico desta Porção semanal da Torá; a palavra Matot está no plural, todavia, este termo provém da palavra Matáh מטה, que significa "vara" ou "varão" e por extensão representa a liderança das comunidades através do sistema patriarcal, dando assim a entender o sentido de "homem", tal como escrito na torá, na tradução em português aparece "os cabeças (ou varões) das tribos dos filhos de Israel"; é exactamente neste sentido que se aplica a palavra Matot, que difere da palavra 'tribo' que em hebraico diz-se Shevet שֶׁבֶט ou Shevetim שֶׁבֶטים no plural.
A Parashá Matot é composta apenas de três capítulos, sendo o capítulo 31 o mais extenso, ocupando quatro das sete עֲלִיָה התּוֹרָה Alyiah HaTorá (literalmente subir à Torá), termo usado para designar a subida do leitor à Teba para ler ou apontar com o seu tzitzit a leitura da Torá. A Parashá apresenta em toda a sua extensão de texto três temas diferentes, o primeiro é a Lei dos Votos, a segunda é sobre a vingança diante dos Midianitas, incluindo a morte de Bil'am e por fim, a discussão sobre a primeira distribuição de terras para duas das doze tribos de Israel, Rúben e Gad. 
A Lei dos Votos de promessas, juramentos e abstinências.
Disse o Eterno a Moisés, que todos os votos voluntariamente proferidos por homem ou mulher, ainda que não sejam sobre uma proibição toraídica, devem ser cumpridos, assim, todos os que com a sua boca professam votos, juramentos ou prometem a si mesmos uma abstinência, devem cumprir a sua palavra, devem honra-la. Salvo se uma filha for desautorizada por seu pai, fica desobrigada e o Eterno perdoa-a, ou ainda se uma esposa for impedida de cumprir sua promessa e seus votos por determinação de seu marido, então essa mulher estará desobrigada a cumprir a sua palavra perante o Eterno que perdoa-la-á.
Israel impõe severa derrota aos midianitas e a morte a Bil'am.
Moisés indica que o Eterno ordenara que fossem vingados os filhos de Israel, atacando Midian que deverá ser derrotada, D-us indica ainda que após isso, Moisés se iria reunir aos que partiram dos que vieram do Egito, e assim, Moisés ordena segundo a vontade de HaShem, que se armem com doze mil homens, sendo mil de cada tribo, envia também Pinchás com os objetos sagrados. Após a severa batalha, os filhos de Israel levaram consigo os despojos de guerra e ainda como cativas as mulheres midianitas, juntamente com as crianças de ambos os sexos, tendo assim levantado a ira de Moisés, que ordena que as mulheres midianitas adultas, que tenham conhecido homem, sejam mortas, sobrevivem apenas as meninas e as jovens virgens; isto porque devido a Bil'am, as mulheres midianitas levaram os israelitas ao pecado, provocando uma praga que trouxe a morte a vinte e quatro mil pessoas dentre os filhos de Israel. Moisés ordena ainda que os soldados se purifiquem no deserto durante sete dias, e que os despojos sejam purificados no fogo, tais como objetos de metal, todo o resto será purificado na água.
A reivindicação de terras pelas tribos de Rúben e Gad.
As tribos de Rúben e de Gad, eram tribos pastorícias, criadoras de gado, e tinham gado em abundância, e viram os filhos de Ruben e Gad que aquelas terras eram boas para o gado, e pediram a Moshê Rabenu que lhe concedesse as terras e não os obrigasse a ultrapassar o rio Jordão. Todavia aquela terra não era a Terra Prometida, e Moisés indignou-se com eles, perguntou-lhes porque ficariam fixos no lugar, deixando os seus irmãos irem sozinhos para a guerra, na conquista da Terra Prometida.
Os líderes descendentes das tribos de Rúben e de Gad, negoceiam com Moisés, prometendo armar-se e ajudar os seus irmãos a conquistar a Terra Santa, não pedindo nenhuma parte da Terra, porque a terra de Guilead que avistaram, chega-lhes para a pastorícia, e prometeram voltar apenas após a conquista da Terra Santa. Mas deixariam o seu gado nos currais, as suas mulheres e crianças nas cidades fortificadas e seguiriam para a guerra. Assim, após o acordo, foi conquistada a Terra de Guilead e expulsos os amoreus.
Interpretação da Parashá
Esta Parashá inicia com a palavra Matot, que na verdade não é Tribos, tal como acima foi explicado, mas "varões", referindo-se aos príncipes de cada uma das tribos; A presente porção semanal, foca três tópicos, a honra da palavra dada, a guerra contra Midian, na qual morre Bil'am e por fim a disputa das terras aquém Jordão, tendo como núcleo central o pecado, o compromisso e a perseverança.
Honrar a palavra dada
No judaísmo a palavra dada tem uma importância fulcral, está intimamente ligada à honra, à dignidade e ao respeito, a palavra é a matéria prima da criação do Eterno, pela palavra o Eterno criou a luz, os astros, a terra, os animais e o ser humano. E toda a promessa do Eterno é cumprida, Ele não volta atrás. Todavia, no judaísmo fazer um juramento ou uma promessa é por si só considerado um pecado, na medida que a pessoa se atribui a si mesma uma capacidade plenipotenciária ilimitada, sendo que isso equivale a não confiar no Eterno, só Ele é que pode fazer cumprir, de acordo com a nossa fé, o que desejamos com sinceridade e verdade.
Este comentário na Torá, faz menção a promessas de abstinência de coisa ou acto licito, ou de promessa positiva em agradecimento a um objectivo que se atingiu pela graça do Eterno. Todavia, pode ser feito irreflectidamente e quem ouvir o voto, seja pai ou marido, mãe ou esposa, poderá anula-lo, mas a própria pessoa não, à imagem e semelhança de D-us que não anula as suas promessas, assim, se a promessa for anulada por quem pode anula-la o incumprimento não é pecado, mas em caso contrário, se não for anulada o incumprimento é pecado.
De igual modo, podemos reflectir, sobretudo nos dias de hoje, em particular no que concerne ao cumprimento das Mitzvot, tal como a observância do Shabat, que claramente estamos obrigados a cumprir, e caso não o cumpramos, estaremos em pecado. No entanto, num mundo globalizado e numa economia de mercado, em países laicos, sem religião oficial, e onde as comunidades judaicas são a minoria; ter que trabalhar aos sábados, ainda que contra a sua vontade, é para alguns judeus uma questão dolorosa que é feita pelo imperativo da sobrevivência, sua e da sua família. Neste sentido, há uma hipótese, que é a pessoa revelar-se judia e que pretende praticar a observância judaica do Shabat, e assim, pede a dispensa do trabalho ao sábado, ainda que isso implique na imposição de trabalhar ao domingo, ou então, na redução salarial referente ao dia de Shabbat, e caso seja negado esse direito, o que infelizmente muitas vezes ocorre por antissemitismo, então, o pecado recai a quem negou o direito, assim a pessoa judia não entra em pecado. No entanto, manter-se-á na busca de uma melhor condição profissional, que permita a prática da observância judaica. 
A Guerra com os midianitas (o maligno)
A Guerra com Midian, aqui parece-nos muito dramática, não só pela gravidade do pecado, mas pela expressão de violência, que até em parte a Torá evitou falar; contudo, pode-mos aferir que muito do que se refere a Torá é simbólico, é uma mensagem que nos quer dizer algo, daí a dimensão do drama, das pragas que matam milhares por causa da fornicação, das mulheres mortas, mas como simbologia, esta é a luta de cada um de nós, a luta pelo aperfeiçoamento da nossa alma, e sobretudo da nossa conduta que pode alimentar a alma de bem, ou polui-la com o mal. É neste sentido que relata o pecado da luxuria, o sexo em si não é pecado numa relação de amor entre marido e mulher da qual nasce uma família, mas o uso egoísta e materialista da sexualidade que usa e reduz o outro, neste caso as mulheres a um mero objecto, é o símbolo de uma sociedade doente, e de um modo de vida vazio, não se aplica, a um povo que esteve a purgar no deserto, para se purificar de tudo o que de errado havia, material e espiritualmente no Egito, assim, a perseverança, não é só na luta pela Terra prometida, mas pelo aperfeiçoamento que cabe a cada um de nós, saber em que medida necessitamos, e saber, que nos será concedido pelo Eterno.
Nesse sentido, tudo o que é despojos, pode simbolizar tudo o que precisamos purificar em nós, o que for resistente como o metal, purifica-se no fogo, o que for de outra substância, é purificado nas águas do Mikvé.
A disputa de terras e o compromisso
Nesta passagem, a lição que aprendemos, é a de que ser um povo, não é ser meramente parte de um povo, não é apartar-se, ou seja, não podemos ir apenas até onde nos convém, devemos ir até onde o compromisso assumido nos obriga enquanto povo, Ruben e Gad, viram a terra de Guilead que lhes agradava, de acordo com os interesses da tribo e suas gentes, mas a sua atitude inicial era de ficar por ali, e deixar que as restantes dez tribos, tivessem o árduo trabalho de lutar com um saldo reduzido de soldados de Ruben e Gad; atitude essa que desagradou a Moisés, que considerou de grande egoísmo e que causaria a destruição da nação Israelita.
O compromisso assumido antes de passar as margens do Jordão, foi um marco importante, que selou a união do povo israelita ensinando que somos um por todos e todos por um. Assim lutou-se antes de tudo pela unidade enquanto nação e uma vez mais consolidou-se o compromisso e afastou-se o perigo da desintegração de Israel, este episódio merece ser sempre lembrado, porque é daqui que vem a frase "A união faz a força", e assim a Parashá termina como começou, com a honra da palavra dada.
HAFTARÁ: jeremiaS 1:1-2:3
Divrei Yermiahu / Palavra de Jeremias
    Disse o Eterno a Jeremias: "Antes que Eu te formasse no ventre de tua mãe, Eu te conheci, e antes que tu nascesses Eu te consagrei, um profeta para as nações te constituí", e responde Jeremias ao Eterno o nosso D-us, "Oh Eterno, eu não sei falar, visto que sou apenas uma criança". Então responde Adonai a Jeremias, "Não digas que és uma criança, pois irás ate todos  a quem Eu te enviar, e tudo que Eu te mandar, dirás. Não tenhas medo, (...) porque Eu estou contigo para te livrar". Mais à frente o Eterno pergunta a Jeremias o que ele vê, e responde Jeremias que é uma vara de amendoeira, o Eterno respondeu dizendo: "Vez bem, porque Eu vigio sobre a minha palavra para a cumprir".


Autor Filipe de Freitas Leal

Sobre o Autor

Filipe de Freitas Leal / Shlomo Mordechai é Licenciado em Serviço Social pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. Trabalhou como Técnico de Serviço Social numa ONG vocacionada à reinserção social de ex-reclusos e ao apoio de famílias em vulnerabilidade social, é Blogger desde 2007 e escritor desde 2015, tem livros publicados da poesia à política, passando pelo Serviço Social.

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